Ontem, por exemplo, não suportava mais tanto descaso, falta de solidariedade, compreensao e até ajuda física. Chorei silenciosamente, segurando as lágrimas. Fui bater pernas para nao falar o que nao deveria. Lembrei muito de minha mãe, que tinha como uma das máximas: "palavras ditas não podem mais ser recolhidas" (dashita kotoba wa hirowarenai, em japonês) . Tive vontade de chorar, chorar, chorar. Tava com pouca grana, tinha pedido pra ela ir sacar, enquanto aguardo compensaçao incerta de um cheque. As horas passaram e nada de ela se mexer pra ir ao caixa eletrônico, que poderia ser encontrado a poucas quadras de casa. Isto porque, na véspera, quando foi dar uma volta com o namorado, foi cheia de promessas: de comprar coisas que faltavam aqui pra casa e de sacar uma grana pra deixar em casa. Tenho muito medo de imprevistos. Nisso, faço parênteses pra explicar: Estou sozinha em casa, com o marido na cadeira de rodas, depois de um AVC. Tudo nele está 50% e nao posso deixá-lo só. Ela voltou depois da meia-noite, cara amarrada, se desculpando que passou em 4 caixas e nao conseguiu sacar. Trouxe umas comprinhas da padaria apenas. Morri de dó. Algo de ruim aconteceu, é claro. Briga com o namorado, na certa. Não perguntei pra nao cutucar a ferida.
Então, da minha caminhada pra espairecer, acabei gastando os últimos trocados numa sapatilha caríssima pra ela. Mãe é assim... Foi ótimo ter feito essa extravagância. Quando cheguei, encontrei-a na cama, olhos inchados de tanto chorar. Viu o mimo e abriu um sorriso. Disfarçou as lágrimas que rolaram pela face. Tive vontade de dizer pra ela nao ser assim durona. Não deu pra falar mais nada. Sei que é difícil ser durona. Sei que a esta altura nao adianta eu ficar dando liçoes de moral. Tenho que entender e passar a mao na cabeça. Afinal, se está assim, eu colaborei muito. Geneticamente ou na educaçao. Nao é culpa, nao me culpo. Mas fiz assim. É assim que mães padecem. É este o nosso paraíso.